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Haiti e Israel têm maior chance de deixar impunes assassinatos de jornalistas, segundo índice de impunidade 2024 do CPJ

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A ampla falta de justiça para jornalistas assassinados é uma grande ameaça à liberdade de imprensa. Mais de uma década depois de a ONU ter declarado o Dia Internacional pelo Fim da Impunidade dos Crimes contra Jornalistas – e mais de 30 anos depois de o CPJ começar a documentar os homicídios – quase 80% dos casos continuam sem solução. É o que mostra o relatório do CPJ.

A journalist's driver injured by tear gas is evacuated near the national palace in Port-au-Prince, Haiti, July 17, 2024. The Caribbean nation became the likeliest nation to let journalists' murderers go free in CPJ's 2024 Global Impunity Index. (Photo: AFP/Clarens Siffroy)
Motorista de um repórter atacado com gás lacrimogêneo é retirado de área próxima ao palácio nacional em Porto Príncipe, Haiti, em 17 de julho de 2024. O Haiti se tornou a nação com maior probabilidade de deixar os assassinos de jornalistas em liberdade segundo o Índice de Impunidade Global 2024 do CPJ. (Crédito: AFP/Clarens Siffroy)

Duas pequenas nações – Haiti e Israel – são hoje as maiores criminosas do mundo quando se trata da impunidade de assassinos de jornalistas, de acordo com o Índice de Impunidade Global 2024 do CPJ. A ferramenta mede o número de assassinatos não resolvidos proporcionalmente à população de um país. É a primeira vez que Israel aparece no índice desde a criação da ferramenta, em 2008.

No Haiti, que lidera o ranking, um sistema judicial de fraco a inexistente, a violência das gangues, a pobreza e a instabilidade política contribuíram para o fracasso na responsabilização dos assassinos. O Haiti entrou no índice pela primeira vez em 2023, em terceiro lugar, logo depois que grupos criminosos tomaram conta de grande parte do país após o assassinato do presidente Jovenel Moïse, em 2021. A imprensa do país entrou em uma “crise existencial” que forçou muitos veículos a cortar funcionários ou encerrar as atividades.

Já o assassinato intencional de jornalistas em Gaza e no Líbano durante a guerra levou Israel ao segundo lugar do índice, que cobre o período de 10 de setembro de 2014 a 31 de agosto de 2024. O CPJ documentou o assassinato de cinco jornalistas – quatro palestinos e um libanês – desde o início da guerra, e investiga os possíveis homicídios intencionais de mais dez jornalistas. Dado o desafio de documentar o conflito, o número pode ser muito maior. No geral, Israel matou um número recorde de jornalistas palestinos desde que a guerra começou, em 7 de outubro de 2023

Como o CPJ define “assassinato” e “impunidade”

O CPJ registra dados sobre assassinatos e prisões de jornalistas desde 1992. Nossa metodologia, usada desde o início em todos os países, é a seguinte:

Assassinato

Apenas os casos definidos como “assassinato” estão incluídos no índice de impunidade. O CPJ define “assassinato” como o homicídio de um jornalista, de forma premeditada ou espontânea, quando a nossa pesquisa nos permite dizer com razoável certeza que o indivíduo foi morto em conexão direta com o seu trabalho como jornalista. Em muitos casos, não podemos dizer de forma conclusiva que a morte estava relacionada ao trabalho da vítima (por exemplo, em países com altos níveis de corrupção e crime, como o México, ou durante guerras com altos níveis de baixas civis, como a guerra Israel-Gaza). O fato de alguém não ter sido classificado como vítima de homicídio na base de dados do CPJ não deve significar que o CPJ considera que o indivíduo foi morto de forma legal.

Impunidade

A impunidade ocorre quando indivíduos ou nações não são responsabilizados por esses assassinatos. A impunidade total, medida pelo nosso índice, significa que ninguém foi responsabilizado pelo assassinato deliberado de um jornalista.

Outras classificações

Por favor, veja a metodologia do CPJ para saber mais detalhes sobre as classificações.

O CPJ pesquisa e atualiza continuamente os casos e pode mudar as classificações à medida que mais evidências são coletadas.

Como o índice de impunidade do CPJ mede o número de assassinatos de jornalistas não resolvidos como um percentual da população de cada país, a maior população de Israel e Territórios Ocupados da Palestina o coloca proporcionalmente atrás do Haiti, embora registre mais casos. Apenas as nações com cinco ou mais homicídios não resolvidos estão incluídas no índice. Israel não foi incluído no índice do ano passado, porque a guerra em Gaza começou após a data de corte do índice, de 31 de agosto de 2023. Saiba mais sobre a metodologia do índice aqui

Mais sobre impunidade

Globalmente, o índice do CPJ descobriu que a grande maioria (77%) dos assassinos de jornalistas escaparam com total impunidade, o que significa que ninguém foi responsabilizado por seus crimes, que seguem sem solução. O número representa melhora em relação ao índice de 90% registrado pelo CPJ há uma década e é um pouco melhor do que os 78% documentados pelo CPJ em 2023, mas certamente não é motivo de celebração. A impunidade se entranhou em todo o mundo, com cerca de quatro em cada cinco assassinos de jornalistas seguindo impunes. 

Embora Haiti e Israel tenham ultrapassado os ocupantes tradicionais dos primeiros lugares no índice, isso não significa que outros países criminosos tenham melhorado sua posição e corrigido as injustiças contra jornalistas. 

Somália, Síria e Sudão do Sul completam o grupo dos cinco piores países em impunidade em 2024. Os três aparecem no índice do CPJ há pelo menos uma década. A Somália é um dos seis países incluídos em todos os 17 anos de existência do índice, demonstrando a natureza persistente da impunidade no país.

Impunidade arraigada, mesmo nas democracias  

Os países presentes no índice estão espalhados por vários continentes, mas todos sofrem com um ou mais fatores que permitem que os assassinos de jornalistas escapem da justiça: guerras, revoltas, governos autoritários, presença do crime organizado e de gangues e falta de ação política e judicial. O efeito sobre a liberdade de imprensa é pernicioso. Quanto mais tempo durarem essas condições, maior a chance de a impunidade se entranhar, forçando os jornalistas a fugir de seus países de origem, se autocensurar ou abandonar a profissão.

As democracias não estão imunes a essa tendência assustadora.

O México registrou o maior número total de assassinatos de jornalistas impunes (21) durante o período do índice e ficou em oitavo lugar no índice geral devido à sua considerável população. Um dos países mais perigosos do mundo para os meios de comunicação, o México registrou um aumento na violência mortal em 2024, depois de ter caído dos níveis recordes de 2022. Um relatório conjunto do CPJ e da Anistia Internacional revelou que a incapacidade do governo mexicano em resolver de forma adequada as deficiências do Mecanismo Federal para a Proteção de Defensores de Direitos Humanos e Jornalistas limita sua capacidade de prevenir a violência contra repórteres. A corrupção desenfreada e o crime organizado muitas vezes dificultam determinar se um jornalista foi alvo devido a seu trabalho. 

No Brasil, que vive uma democracia desde a década de 1980, a corrupção e a censura seguem generalizadas, contribuindo para a morte de dez jornalistas no período do índice. A maioria dos casos ocorreu fora dos grandes centros urbanos e envolveu jornalistas de pequenos veículos locais (5), estações de rádio (3), e freelancers (2). A impunidade reina; mesmo os casos com repercussão internacional, como o assassinato de Dom Phillips na Amazônia brasileira em 2022, continuam sem solução. Três réus foram presos e devem ser julgados. O suposto mentor também foi preso, mas a justiça ainda não foi cumprida.

Ranking do Índice de Impunidade Global de 2024 do CPJ

ClassificaçãoPaísNúmero de assassinatos não resolvidosPopulação em milhões*Anos entre os principais países no índice
1Haiti711.72
2Israel e Territórios Ocupados da Palestina (IOPT)*814.91
3Somália918.117
4Síria1123.211
5Sudão do Sul511.110
6Afeganistão1842.216
7Iraque1145.517
8México21128.517
9Filipinas18117.317
10Mianmar854.63
11Brasil10216.415
12Paquistão8240.517
13Índia191428.617
Fonte: Os dados do CPJ e os dados populacionais dos Indicadores de Desenvolvimento Mundial do Banco Mundial de 2023, coletados em setembro de 2024, foram usados para calcular a classificação de cada país. Regiões dentro de uma nação que são parcialmente controladas ou ocupadas por essa nação, como a região do Curdistão do Iraque e Gaza e Israel, estão incluídas nos números populacionais desse país.

*O total para Israel e Territórios Ocupados da Palestina inclui o assassinato do jornalista da Reuters Issam Abdallah, morto no Líbano por forças israelenses que dispararam de Israel.

Muitas outras nações do índice têm visto assassinos de jornalistas escaparem impunes, incluindo: 

Tal como Haiti e Israel, Mianmar também entrou recentemente no índice. Sua primeira menção foi em 2022. O número de jornalistas assassinados impunemente em Mianmar subiu para oito, com três novos casos documentados em 2024. O aumento das mortes vem de uma dura repressão à imprensa livre, já que os militares prenderam dezenas de jornalistas e proibiram mais de uma dúzia de veículos independentes de atuar desde que tomaram o poder em 2021.

Força de investigação internacional pode reforçar leis da ONU contra a impunidade

Em 2013, cinco anos depois de o CPJ ter lançado o seu primeiro índice da impunidade, a ONU criou o Dia Internacional pelo Fim da Impunidade dos Crimes contra Jornalistas. A data vem servindo como uma ferramenta de incidência para destacar os países onde a impunidade por assassinatos de jornalistas está enraizada.

Em seguida, veio uma série de resoluções da ONU para apoiar jornalistas. A mais significativa foi a Resolução 2222 do Conselho de Segurança (2015) da ONU, que estabelece que os jornalistas são civis e estão protegidos pelo Direito Internacional. Atacar deliberadamente civis constitui crime de guerra. Em 2017, a ONU adotou a Resolução 33/2 do Conselho de Direitos Humanos, que determina que os estados membros “previnam, protejam e processem” para acabar com a impunidade. 

Apesar dos parâmetros internacionais destinados a combater a impunidade, a falta de melhorias significativas na responsabilização pelas mortes de jornalistas nas últimas décadas indica que é necessário fazer mais para punir os criminosos. Em dezembro de 2020, o CPJ – juntamente com os parceiros Repórteres Sem Fronteiras e Free Press Unlimited – lançou o projeto Safer World for the Truth, que publicou relatórios sobre casos não resolvidos de assassinatos de jornalistas. Os relatórios mostraram que uma falha comum foi que os investigadores negligenciaram os parâmetros internacionais – especificamente os da ONU conhecidos como o Protocolo de Minnesota – a nível local para garantir a responsabilização. Investigações policiais falhas, coleta de provas fora do padrão e erros nos processos judiciais foram frequentes nesses casos.

Como resultado, o CPJ defende ativamente, junto com parceiros da liberdade de imprensa e outros, uma força-tarefa internacional de investigação focada em crimes contra jornalistas. Um projeto inicial, proposto em 2020 por um painel de especialistas legais, pode mobilizar recursos ou fornecer aconselhamento em situações em que a aplicação da lei local possa ser prejudicada ou não exista vontade política para investigar crimes contra jornalistas. Os Países Baixos realizaram um estudo de viabilidade a partir do projeto inicial. 


A impunidade segue endêmica como sempre 

No período registrado pelo índice, o CPJ identificou 241 casos nos quais havia provas claras de que as mortes estavam diretamente ligadas ao trabalho das vítimas. Menos de 4% dos assassinados conseguiram justiça total; 19% obtiveram justiça parcial, o que significa que parte dos assassinos foi responsabilizada; e os restantes 77% não tiveram justiça. 

Desde 1992, o CPJ classificou 974 mortes de jornalistas como assassinatos, com apenas 5% a receber justiça total e 79% sem resolução. Os números não mudaram muito neste ano, assim como os perigos que os jornalistas enfrentam. A impunidade segue tão endêmica como sempre, e as famílias e colegas de jornalistas assassinados têm pouca probabilidade de ver alguém responsabilizado. 

Em nenhum lugar essa realidade é mais sombria do que nos casos de 30 jornalistas cujos assassinos ainda estão livres  mais de 30 anos depois de o CPJ documentar suas mortes, em 1992.

Apenas os casos que envolvem total impunidade estão listados no nosso índice; aqueles em que alguns foram condenados, mas outros suspeitos permanecem livres (impunidade parcial), não estão no índice.

Jornalistas por trás dos números 

Por trás dos cálculos e classificações estão os jornalistas mortos e seus colegas, famílias e amigos em luto. Aqui alguns jornalistas mortos durante o período do índice, cujos assassinos não foram responsabilizados: 

Journalist Garry Tesse (Photo: Courtesy Tesse family)
O jornalista Garry Tesse (Crédito: Courtesy Tesse family)

O jornalista e apresentador de rádio haitiano Gerry Tesse, cujos restos mutilados foram encontrados seis dias após o seu desaparecimento em outubro de 2022, teve sua morte classificada pelo CPJ como um ato em retaliação a seu trabalho com base em novas informações. Pouco antes de sua morte, Tesse descreveu no rádio um plano para matá-lo, arquitetado por um poderoso promotor que enfrenta acusações de corrupção. Tesse era um crítico persistente e declarado da corrupção e dos abusos de poder.

Journalist Sagal Salad Osman (Screenshot: SNTV)
A jornalista Sagal Salad Osman (Screenshot: SNTV)

Sagal Salad Osman, produtora e apresentadora da Radio Mogadishu, foi assassinada por agressores somalis em 2016, no que a polícia disse ter sido um crime cometido pelo grupo rebelde Al-Shabaab. Os militantes têm um histórico de atacar jornalistas da Radio Mogadishu e de outros veículos de comunicação estatais, de acordo com a pesquisa do CPJ. Mulheres em posições públicas foram alvo em particular dos crimes, de acordo com um relatório de 2016 da Iniciativa Estratégica para as Mulheres no Chifre da África [Strategic Initiative for Women in the Horn of Africa]. Também estudante universitária, Osman produzia programação infantil para a rádio, de acordo com um jornalista que pediu para permanecer anônimo.

O jornalista da Reuters Issam Abdallah (Crédito: Reuters/Issam Abdallah)

Os cinco jornalistas que o CPJ acredita terem sido alvo de forma clara e deliberada por Israel são: Issam Abdallah, cinegrafista libanês da Reuters, morto em 13 de outubro de 2023; Hamza Al Dahdouh e Mustafa Thuraya, mortos em 7 de janeiro no carro, quando voltavam de uma cobertura; e Ismail Al Ghoul e Rami Al Refee, mortos em 31 de julho em um ataque por drone. Todos cobriam a guerra, e três dos cinco usavam coletes de imprensa no momento em que foram mortos.

Journalist and satirist Pamela Montenegro (Screenshot: El Sillón Show/YouTube)
A jornalista e humorista Pamela Montenegro (Screenshot: El Sillón Show/YouTube)

Pamela Montenegro, jornalista, crítica famosa pelo tom satírico e influenciadora no YouTube no México, foi baleada fatalmente em 2018 por dois criminosos, em um restaurante de propriedade dela e do marido. Ela era muito conhecida por sua persona online “La Nana Pelucas” (Avó de Peruca). Tanto como editora da revista online El Sillón, como na personagem La Nana Pelucas, Montenegro cobria política local na cidade litorânea de Acapulco, no estado de Guerrero, e frequentemente zombava dos políticos locais.

Radio journalist Pavel Sheremet (Photo: Reuters/Valentyn Ogirenko)
O radialista Pavel Sheremet (Crédito: Reuters/Valentyn Ogirenko)

Pavel Sheremet, um dos vencedores de 1998 do International Press Freedom Award do CPJ, era um cidadão russo nascido em Belarus morto por um carro-bomba em 2016 na Ucrânia. Ele fazia reportagens e apresentava um programa de rádio no qual comentava a atividade criminosa de gangues e a corrupção da polícia e do governo. Segundo amigos de Sheremet, no ano anterior à sua morte, ele relatou estar sendo perseguido em Kiev. Em 2015, disse à Reuters que se sentia inseguro ao visitar Moscou. Cinco suspeitos do crime foram apresentados em 2019, e tanto o Serviço de Segurança Federal da Rússia como a KGB de Belarus foram acusados pela explosão. Mas ninguém foi julgado pelo assassinato de Sheremet.

Reporter Htet Myat Thu (Photo: Voice of Thanbyuzayat)
O repórter Htet Myat Thu (Crédito: Voice of Thanbyuzayat)

Os assassinatos em Mianmar dos repórteres Htet Myat Thu, Win Htut Oo e Myat Thu Tan em 2024 marcam o pior ano do país para a impunidade. Sete dos oito jornalistas assassinados no período do índice foram mortos após o golpe de 2021, após o qual a junta prendeu dezenas de jornalistas e usou amplas leis anti-estatais para silenciar reportagens independentes. Htet Myat Thu, conhecido jornalista que havia sido baleado e preso enquanto denunciava um protesto antigolpe, foi morto em um ataque à casa de sua família, juntamente com Win Htut Oo, amigo de infância que trabalhava desde o exílio no Democratic Voice of Burma. Segundo fontes, Myat Thu Tan foi morto enquanto estava detido por publicações críticas que fez no Facebook. 

Mais sobre os cinco países que lideram o índice 

Haiti

A ascensão do Haiti ao topo do índice neste ano ocorreu após os assassinatos não resolvidos de sete jornalistas desde 2019. 

No final de fevereiro de 2024, o Haiti viveu possivelmente o período mais catastrófico de sua história recente depois que uma união de gangues armadas declarou guerra aberta ao estado, entrando no maior presídio da capital, Port-au-Prince, e libertando mais de 4.000 presos, muitos deles criminosos violentos. O primeiro-ministro interino, Ariel Henry, foi forçado a renunciar, e um governo de transição foi instalado com o apoio dos EUA e do grupo regional CARICOM, de países caribenhos.

Mas, mesmo após a implantação de uma força de segurança internacional liderada pelo Quênia, com 400 membros capacitados, grandes faixas de Port-au-Prince permanecem sob controle de gangues, em meio a um deserto de escombros e uma população sofrendo com a fome.

O caos econômico e a ruína forçaram muitos jornalistas a fugir e levaram muitos meios de comunicação haitianos a suspender as operações ou a reduzir suas equipes, com alguns a ponto de encerrar atividades.  

Ao mesmo tempo, a instabilidade política só piorou o estado do poder judiciário já disfuncional do Haiti, o que levou o país a se tornar o primeiro do Caribe incluído na lista anual de nações onde os assassinos seguem impunes. Agora, o Haiti subiu para o topo da lista das piores nações no índice de impunidade 2024 do CPJ.

Israel

Na guerra mais perigosa e sem precedentes para os jornalistas que o CPJ já registrou, Israel matou ao menos 126 jornalistas e trabalhadores da comunicação, quase todos palestinos, tendo como alvo pelo menos cinco desses jornalistas especificamente devido a seu trabalho e levando a pequena nação a figurar pela primeira vez no índice de impunidade do CPJ. Israel negou que tenha como alvo diretamente os jornalistas na guerra, mas seus militares têm um histórico de morte de jornalistas há muito tempo. No relatório Deadly Pattern publicado antes da guerra, o CPJ descobriu que ninguém foi responsabilizado pelos assassinatos de 20 jornalistas por ações militares nos últimos 22 anos.

O relatório, lançado em maio de 2023, foi um prenúncio da resposta do país aos assassinatos dos cinco jornalistas na guerra Israel-Gaza. Em um caso, várias investigações independentes descobriram que Israel disparou deliberadamente contra jornalistas no sul do Líbano em 13 de outubro de 2023, matando o jornalista da Reuters Issam Abdallah e ferindo outros seis. Apesar das investigações exaustivas e detalhadas, Israel não tomou nenhuma atitude.

Somália

Pior agressor no índice de 2015 a 2022, e presente no índice todos os anos desde a sua criação, a Somália caiu da segunda posição, abaixo da Síria, em 2023, para a posição de número três. A maioria dos nove jornalistas vitimados durante o período do índice morreu entre 2014 e 2018. Acredita-se que eles tenham sido vítimas do Al-Shabaab, grupo insurgente que procura estabelecer um estado islâmico na Somália. Apesar da ligeira queda, os jornalistas ainda enfrentam sérios riscos. A Somália continua instável em meio a uma ofensiva contínua contra o Al-Shabaab. Cobrir o conflito prolongado continua sendo perigoso e até mortal. Os veículos de comunicação sofrem para fazer reportagens, enquanto os jornalistas enfrentam detenções, ameaças e assédio.

Síria

Onze jornalistas foram assassinados com total impunidade na Síria durante o período reportado no índice de 2024. Sete morreram entre 2014 e 2016, quando a revolta inicial contra o regime de Bashar al-Assad se ampliou para uma guerra em larga escala, envolvendo potências regionais e globais, e o Estado Islâmico começou a tomar o controle do território sírio. Acredita-se que o Estado Islâmico tenha assassinado a maioria dos sete mortos entre 2014 e 2016. Embora os combates tenham diminuído desde que Assad recuperou o controle da maior parte do país, os meios de comunicação sírios continuaram a sofrer golpes seguidos, com numerosos jornalistas forçados a fugir para o exílio e as autoridades governamentais e líderes locais seguindo com atos de assédio, ameaças ou prisão de jornalistas.    

Sudão do Sul

Os cinco jornalistas assassinados no Sudão do Sul em 2015 mantiveram a nação na lista de impunidade, mostrando que houve pouco ou nenhum esforço para obter justiça por seus assassinatos. Mortos durante a guerra civil do Sudão do Sul em 2013-2020, os cinco são emblemáticos de como vivem os jornalistas sob pressão em uma nação atormentada pela instabilidade desde a independência, em 2011. O CPJ documentou vários casos de assédio, detenção e prisão de jornalistas, além da morte de um repórter de guerra em fogo cruzado nos últimos anos. 


Em setembro de 2024, o Sudão do Sul sofreu um revés na sua transição pós-guerra civil, quando o mandato do governo de transição foi prolongado por mais dois anos, e as eleições, adiadas. A contínua incerteza política e o persistente conflito em partes do país têm graves consequências para a segurança dos civis, incluindo jornalistas. Os membros da imprensa no Sudão do Sul seguem sob o risco de serem detidos por seu trabalho, e a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas no país tem relatado censura generalizada e autocensura dos meios de comunicação, incluindo cobertura relacionada com a transição. 

Metodologia do Índice de Impunidade

O Índice de Impunidade Global do CPJ calcula o número de assassinatos de jornalistas não resolvidos como uma porcentagem da população de cada país. Para este índice, o CPJ examinou os homicídios de jornalistas ocorridos entre 10 de setembro de 2014 e 31 de agosto de 2024 que permanecem sem solução. Apenas as nações com cinco ou mais casos não resolvidos estão incluídas no índice. O CPJ define o assassinato como o homicídio de um jornalista, premeditado ou espontâneo, cometido em relação direta com o trabalho da vítima. Os casos são considerados não resolvidos quando não foram obtidas condenações, mesmo que suspeitos tenham sido identificados e estejam sob custódia. Os casos em que alguns suspeitos, mas não todos, foram condenados, são classificados como impunidade parcial. Os casos em que os suspeitos foram mortos durante a detenção também são categorizados como impunidade parcial. O índice só contabiliza assassinatos perpetrados com total impunidade. Não inclui aqueles para os quais a justiça parcial foi alcançada. Os dados populacionais de 2023 dos Indicadores de Desenvolvimento Mundial do Banco Mundial, colhidos em outubro de 2024, foram usados para calcular a classificação de cada país. Regiões dentro de uma nação que são parcialmente controladas ou ocupadas por essa nação, como a região do Curdistão do Iraque e Gaza em Israel, estão incluídas nos números populacionais desse país.