A polícia prendeu o fotojornalista Santos Samuesecca enquanto ele cobria um protesto antigovernamental na capital angolana, Luanda, em 24 de outubro de 2020. Vários jornalistas, incluindo o que tirou a foto, foram presos ou intimidados. (Osvaldo Silva)

Polícia angolana detém, assedia e espanca jornalistas que cobriam protestos

Nova Iorque, 27 de outubro de 2020 – A polícia angolana deve parar de prender e agredir jornalistas e permitir que façam o seu trabalho livremente, disse hoje o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ).

Pelo menos seis jornalistas e um trabalhador de meios de comunicação foram detidos – quatro deles por mais de dois dias – e outro foi perseguido durante a cobertura de protestos antigovernamentais de grupos da sociedade civil e partidos da oposição na capital, Luanda, no dia 24 de outubro, segundo informações da imprensa  e de Teixeira Cândido, secretário-geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA), que falou com o CPJ através da app de mensagens. Todos os detidos foram libertados sem acusação, disse Candido.

“As autoridades angolanas devem parar de perseguir e deter jornalistas que estão simplesmente fazendo seu trabalho e devem permitir que façam suas reportagens livremente”, disse Angela Quintal, coordenadora do programa do CPJ para a África. “O fato de três dos jornalistas detidos e um motorista finalmente terem sido libertados sem acusações após mais de dois dias sob custódia mostra a vingança da polícia, pois eles sabiam que os jornalistas estavam simplesmente cobrindo as notícias do dia.”

A polícia obrigou dois jornalistas da emissora privada Radio Essencial, Suely de Melo e Carlos Tomé, o fotógrafo Santos Samuesecca, da publicação irmã Valor Económico, e o motorista, Leonardo Faustino, a saírem do carro por volta das 10 horas e 30 minutos, enquanto os jornalistas estavam cobrindo os protestos, de acordo com um comunicado de Evaristo Mulaza, diretor da GEM Angola Global Media, empresa proprietária dos dois meios de comunicação. No texto, enviado ao CPJ por meio de um aplicativo de mensagens, Mulaza disse que os jornalistas se identificaram para a polícia como jornalistas no exercício da profissão. Contou também que a polícia agrediu os jornalistas e apreendeu seus telefones celulares e uma câmera. Geralda Embalo, diretora-executiva do Valor Económico e da publicação irmã Nova Gazeta, posteriormente deu mais detalhes do ataque por meio de app de mensagens, informando que os quatro foram espancados com cassetetes e chutados pela polícia: “Nada quebrado, [ficaram] apenas machucados, apavorados, humilhados … ”. Embalo disse que a polícia falou a De Melo:“ Em vez de cobrir manifestações devias procurar um marido ”.

Os quatro foram levados para várias delegacias da polícia até serem finalmente detidos no Comando Provincial de Luanda, disse Mulaza. Os jornalistas e o motorista foram interrogados por um promotor público e liberados sem acusações  às 15 horas de ontem, acrescentando que nenhuma autoridade explicou por que os quatro passaram mais de 50 horas sob custódia policial. Embalo contou que o equipamento dos jornalistas não foi devolvido até agora.

O CPJ falou com o porta-voz da polícia angolana Nestor Gobel por meio de um aplicativo de mensagens em 25 de outubro, um dia antes da libertação dos jornalistas e do motorista, e ele disse ao CPJ que a polícia estava trabalhando para tirar os quatro da custódia. “Não se preocupe, as coisas vão ficar bem”, disse ele. Gobel não respondeu às mensagens de acompanhamento enviados ontem nem ao telefonema sobre esse e outros incidentes.

Em outro caso, dois jornalistas que trabalham para a emissora privada TV Zimbo, Domingos Caiombo e Octávio Zoba, foram detidos e obrigados a deletar suas imagens do protesto de 24 de outubro, antes de serem libertados no mesmo dia sem acusações, disse Candido do SJA.

Dois jornalistas, em outro episódio, os freelancers Osvaldo Silva e Nsimba Jorge, que contribuem para a agência de notícias francesa AFP, foram agredidos e assediados pela polícia durante os protestos, conforme relataram. Silva disse ao CPJ, por meio de app de mensagens, que ao chegar ao protesto foi interrogado pela polícia. Ele mostrou suas credenciais de imprensa, mas eles insistiram que ele precisava de autorização da polícia para cobrir os protestos. Ele disse que a polícia o atingiu com as mãos e com cassetetes, jogou-o no chão e chutou-o, e então o jogou em uma viatura policial e confiscou seu telefone. Depois, foi levado a uma delegacia de polícia e liberado no mesmo dia, mas só conseguiu recuperar o telefone mais tarde. Silva acrescentou que voltou ao protesto, onde a polícia bateu em suas nádegas, exigiu suas credenciais de imprensa e o impediu de tirar fotos. Silva contou que então deixou os protestos. Nsimba disse ao CPJ por meio de um aplicativo de mensagens que a polícia queria confiscar sua câmera e, quando ele resistiu, o forçou a deletar tudo em seu cartão de memória; ele informou que não foi detido.

Em um comunicado enviado ao CPJ por meio de um aplicativo de mensagens, o diretor da AFP na África, Boris Bachorz, disse que a agência condena veementemente a agressão e exortou as autoridades angolanas a garantir que os jornalistas possam trabalhar sem obstáculos ou ameaças. Candido instou a polícia a justificar o motivo de estar repetidamente espezinhando os direitos dos jornalistas e violando o direito à liberdade de imprensa reconhecido na Constituição de Angola.

O porta-voz da presidência, Luís Fernando, e a governadora de Luanda, Joana Lina, não responderam às mensagens de texto solicitando comentários enviadas pelo CPJ ontem e em 25 de outubro.