O canal angolano Camunda News, propriedade de David Boio (foto), suspendeu as suas operações indefinidamente após assédio policial. (Foto: David Boio)

Meio de comunicação angolano Camunda News suspende operações por tempo indeterminado após assédio policial

Meio de comunicação angolano Camunda News suspende operações por tempo indeterminado após assédio policial

Nova Iorque, 17 de março de 2023 – As autoridades angolanas devem deixar de assediar o website privado Camunda News e assegurar que os membros da imprensa possam trabalhar livremente, disse na sexta-feira o Comité para Proteção de Jornalistas (CPJ).

Na quarta-feira, 15 de março, a plataforma suspendeu as suas operações indefinidamente, de acordo com reportagens dos meios de comunicação social e o proprietário do veículo, David Boio, que falou com o CPJ através de um aplicativo de mensagens.

Boio disse ao CPJ que a decisão de fechar o Camunda News, que cobria assuntos atuais no seu website, página do Facebook, e canal YouTube, veio depois de meses de assédio governamental.

“As autoridades angolanas devem empenhar-se no desenvolvimento de uma comunicação social livre e independente e abster-se de assediar meios de comunicação online como o Camunda News”, disse Angela Quintal, coordenadora do programa África do CPJ. “Em vez de censura através de intimidação e requisitos arcaicos de licenciamento, o governo deve encorajar uma pluralidade de meios de comunicação social a cumprir o direito do público ao acesso à informação”.

Em outubro de 2022, funcionários do Serviço Nacional de Investigação Criminal da polícia, o SIC, interrogaram Boio sobre Nelson Dembo, um ativista e co-apresentador do programa semanal de atualidades 360˚ transmitido nos canais Camunda News no YouTube e Facebook, disse Boio ao CPJ.

Dembo enfrenta acusações incluindo incitação à rebelião e indignação contra o presidente, e está atualmente escondido, de acordo com reportagens, que dizem que ele acredita que as acusações contra ele são uma retaliação pela sua atividade política.

Boio relatou ao CPJ que os oficiais do SIC também tinham convocado o repórter sénior do Camunda News, llídio Manuel, e dois outros membros do pessoal em outubro. Boio recusou-se a nomear esses funcionários por receio pela segurança deles.

Subsequentemente, em fevereiro de 2023, os agentes do SIC convocaram Boio para o interrogar como potencial testemunha estatal no caso Dembo, de acordo com Boio e esses noticiários. Nessa chamada de telefone, um investigador avisou Boio de que seria emitido um mandado de captura se ele não aparecesse e instruiu-o a trazer documentos da empresa relacionados com o Camunda News.

Durante três horas de interrogatório a 7 de março, Boio relatou ao CPJ que lhe foi feita apenas uma pergunta sobre Dembo e que a maioria das perguntas estavam relacionadas com o Camunda News, o seu estatuto legal e financiamento, e a sua vida pessoal.

Pouco tempo depois desse interrogatório, Boio suspendeu o conteúdo do vídeo de atualidades do Camunda News. Na quarta-feira, ele suspendeu toda a plataforma, disse ele.

“O assédio e a intimidação estão a chegar a um ponto em que podem conduzir a problemas mais graves, e sabemos como o sistema em Angola pode ser complicado e inventar acusações graves, por isso tenho de considerar a minha segurança, bem como a de todos os outros que trabalham no Camunda”, afirmou Boio ao CPJ.

Manuel, o repórter sénior convocado em outubro, disse ao CPJ que não pôde contratar um advogado a tempo e não compareceu ao interrogatório, e que não tinha recebido outra convocatória. Segundo ele, não lhe tinham sido revelados quaisquer pormenores do caso.

Boio declarou ao CPJ que em maio de 2020 um investigador do SIC tinha chegado à sede do Camunda News e perguntado sobre a sua propriedade, e no dia seguinte o meio de comunicação recebeu uma notificação do Ministério das Telecomunicações tecnologias de Informação e Comunicação Social solicitando a documentação para provar que o meio de comunicação estava a funcionar legalmente.

“Escrevemos de volta ao Ministério explicando que não conseguimos encontrar o quadro legal para os conteúdos em linha, tal como o que produzimos”, disse Boio ao CPJ.

“Se tivéssemos uma licença, seríamos provavelmente tratados da mesma forma que os canais de televisão que foram cancelados, mas como não existe um quadro legal eles usam o SIC para nos intimidar”, disse Boio. As autoridades suspenderam três emissoras de televisão em 2021.

Benja Satula, o advogado representante do Camunda News, explicou ao CPJ através de um app de mensagens que não existe um quadro legal que abranja plataformas de conteúdos online, pelo que não poderia haver qualquer atividade ilegal que justificasse uma investigação criminal.

O porta-voz do SIC, Manuel Alaiwa, respondeu aos pedidos de comentários do CPJ por telefone e aplicativo de mensagens, dizendo que telefonaria mais tarde. Ele não tinha respondido até à altura da publicação.

Quando o CPJ telefonou ao porta-voz do Ministério das Tecnologias de Telecomunicações e Media, João Demba, para comentar, ele disse que o ministério não podia comentar porque estava à espera de informações do SIC.

[Nota do editor: este artigo foi modificado para corrigir a grafia do nome Nelson Dembo.]