Cidade do México, 20 de junho de 2017 – As tentativas de investigar jornalistas e ativistas de direitos humanos no México mediante a implantação de um software de espionagem em seus celulares ameaçam a liberdade de imprensa no país, declarou hoje o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ). Um relatório divulgado ontem na Cidade do México pela organização defensora da imprensa Artigo 19, 0s pesquisadores da internet aberta R3D e Citizen Lab da Universidade de Toronto documentaram as tentativas.
Jornalistas, defensores dos direitos humanos e ativistas anticorrupção foram alvo de um complexo software de espionagem capaz de acessar seus contatos, correios eletrônicos e demais informações sensíveis guardadas em seus celulares, de acordo com o Informe. O software também podia gravar cada toque de tela nos dispositivos, o que na prática convertia os microfones dos telefones em um aparelho de escuta, segundo as três organizações.
“A vigilância de jornalistas ameaça a liberdade de imprensa no México, e em potencial a segurança de suas fontes em notícias sensíveis”, declarou em Nova York o diretor de programa e coordenador sênior do Programa das Américas do CPJ, Carlos Lauría. “O governo mexicano deve realizar uma averiguação crível sobre esta intromissão e divulgar publicamente o resultado dessa investigação”.
As vítimas receberam mensagens de texto em seus celulares que continham advertências aparentemente verossímeis sobre o bem-estar de seus familiares, entre outros assuntos. As mensagens convidavam os que recebiam tais textos a clicar em um link que levava a uma página de site vazia que baixava o software de espionagem nos telefones, o qual podia funcionar sem ser detectado.
Entre as vítimas estão os jornalistas investigativos Carmen Aristegui e Carlos Loret de Mola, o diretor da organização de direitos humanos Centro PRODh, e o diretor do centro de pesquisas IMCO, informou o relatório. Os familiares também foram alvo das tentativas: os investigadores descobriram que o filho de Aristegui, de 16 anos, recebeu as mensagens de texto de phishing, assim como a esposa de Juan Párdenas, diretor do IMCO.
O Citizen Lab informou que o software de espionagem usado era o Pegasus, programa criado pela empresa israelense NSO Group como ferramenta digital para combater o terrorismo e o crime organizado. De acordo com reportagens, o NSO Group vende o software Pegasus exclusivamente para governos. A empresa não respondeu aos telefonemas do CPJ para dar uma declaração.
Em 2014, Carmen Aristegui e sua equipe investigativa noticiaram que a esposa do mandatário mexicano havia comprado uma mansão na Cidade do México que pertencia a uma empresa vinculada ao governo. Carlos Loret de Mola investigou supostas execuções extrajudiciais pela polícia federal no município de Tanhuato, situado a cerca de 430 Km ao noroeste da capital. Por sua vez, o Centro PRODh forneceu assistência jurídica aos familiares de 43 estudantes que desapareceram no estado de Guerrero em 2014, enquanto que o IMCO tem sido um firme defensor de uma lei federal anticorrupção nos últimos anos, informou ontem o jornal The New York Times. Segundo o Informe, as vítimas do software receberam a maioria das mensagens de texto de phishing enquanto investigavam ou apoiavam temas que envolviam diretamente instituições governamentais.
O Citizen Lab enfatizou que não era possível rastrear a origem do software até os emissores originais e que não havia provas conclusivas sobre a autoria dos ataques cibernéticos.
O governo federal mexicano negou que tenha espionado jornalistas e ativistas. Um porta-voz do presidente Enrique Peña Nieto enviou ao CPJ a declaração do governo publicada no artigo do The New York Times, na qual “negou categoricamente que quaisquer de seus membros tenha participado de operações de vigilância ou comunicações contra defensores dos direitos humanos, jornalistas, ativistas anticorrupção ou qualquer outra pessoa, sem prévia autorização judicial”.