O Caminho para a Justiça

Capítulo 6: Conclusão

Hoje, a luta contra a impunidade chegou a um momento importante. Há consciência em nível nacional e global acerca do perigo extremo existente para os jornalistas e para o direito do público à informação quando a violência contra a imprensa é recebida com apatia pelos governos. Os gritos de justiça dos defensores da liberdade de expressão foram amplificados pelo endosso da ONU e sua designação do primeiro Dia Internacional pelo Fim da Impunidade de Crimes contra Jornalistas.

É também uma posição precária – em que ganhos modestos poderiam facilmente dar lugar à complacência.

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Este relatório analisou os imensos desafios envolvidos na transformação de ambientes nos quais impera a impunidade, especialmente em áreas convulsionadas por conflitos ou pelo crime generalizado e onde a corrupção, o nepotismo e a agitação política enfraqueceram o Estado de direito. A análise das taxas globais de impunidade do CPJ de assassinatos de jornalistas nos últimos sete anos mostra que elas têm em sua maior parte piorado. Há alguns sinais encorajadores nos dados. O número de condenações de suspeitos de terem cometido esses crimes parece ter se elevado um pouco, mas este número ainda é pequeno em comparação com o registro de novas vítimas a cada ano.

No cerne do problema encontra-se uma persistente falta de vontade política de fazer valer a justiça em centenas de casos em que jornalistas foram mortos a tiros, sofreram atentados a bomba, ou foram agredidos por causa do que estavam reportando. Nos poucos casos em que a justiça tem sido exercida, geralmente em resposta à crescente pressão doméstica e internacional, houve progresso na forma de justiça parcial e, mais raramente, completa para as vítimas. Mas a norma é que os supostos perpetradores – políticos, membros das forças armadas, e outras figuras com poder e influência em suas sociedades – conseguem escapar da justiça. Este padrão se aplica especialmente para aqueles que encomendam assassinatos de jornalistas.

O CPJ vê os efeitos devastadores da impunidade diariamente em histórias de autocensura, exílio e revolta, mas também tem visto que há maneiras de combatê-la.

Ao longo do tempo, em casos raros, mas importantes, os esforços corajosos de parentes e colegas determinados a exigir resultados e a questionar as investigações mal feitas mantiveram a atenção da mídia e campanhas; a pressão diplomática da comunidade internacional; e litígios através dos tribunais nacionais e regionais têm empurrado a justiça para frente ou convenceram os governos a tomar medidas mais abrangentes.

Manifestantes protestam contra o assassinato do jornalista iraquiano Hadi al-Mehdi, que foi morto a tiros em 2011. Ninguém foi responsabilizado. (AP/Karim Kadim)
Manifestantes protestam contra o assassinato do jornalista iraquiano Hadi al-Mehdi, que foi morto a tiros em 2011. Ninguém foi responsabilizado. (AP/Karim Kadim)

Como o relatório demonstra, há uma série de medidas que os Estados podem adotar para assegurar processos seguros e justos. Elas incluem triagem de nível nacional investigativo e recursos para a procuradoria – em alguns países, isto assume a forma de envolvimento federal em crimes contra jornalistas ou contra a liberdade de expressão – mudando os locais de julgamento, aperfeiçoando o programa de proteção a testemunhas, reformando o sistema judiciário para limitar as oportunidades de abuso por parte de réus poderosos, e criando organismos independentes para examinar investigações mal feitas. Transparência e prestação de contas para as vítimas e para o público, e estreita consulta junto à mídia e às organizações não governamentais são as chaves para uma implementação bem sucedida. Um bom exemplo pode ser encontrado na Comissão da Sérvia para a Investigação de Assassinatos de Jornalistas, em que jornalistas e autoridades vinculadas à investigação vêm examinando conjuntamente casos antigos e produzindo novas pistas, o que levou à prisão de suspeitos em pelo menos um caso.

Algumas destas soluções exigem amplos recursos, legislação ou desenvolvimento a longo prazo das capacidades institucionais a par de melhorias profundas na governança. Mas também há medidas imediatas que podem ser tomadas que não necessitam de fundos substanciais ou de mudança política. Os governos que propõem a convocação de inquéritos especiais em certos casos podem e devem tornar os resultados públicos. As conclusões da comissão nomeada pelo presidente do Curdistão para investigar o assassinato de Sardasht Osman e o inquérito judicial no Paquistão sobre a morte de Hayatullah Khan são dois bons exemplos para começar. O envolvimento de autoridades da alta cúpula na investigação de casos individuais e a expansão das investigações para incluir os mandantes suspeitos deve ser rotina; essa tendência pode ser vista no Brasil, onde condenações em quatro casos ocorreram nos últimos dois anos – incluindo, em um, do mentor. No contexto dos compromissos assumidos pelos governos para garantir a segurança dos jornalistas, acabar com a impunidade e promover o Estado de direito, estas não são medidas extraordinárias.

O cumprimento das obrigações da ONU para o combate à impunidade deve agora ser primordial para os Estados membros, começando com respostas exaustivas e públicas aos pedidos do diretor-geral da UNESCO para o status judicial em casos de jornalistas mortos. Os governos também devem definir expectativas para cada 2 de novembro como um momento para tomar uma posição contra a impunidade e fazer um balanço honesto de seu progresso na resolução de assassinatos de jornalistas. A cada ano, os Estados que estão lutando contra altos níveis de violência contra a imprensa e a impunidade devem conseguir um progresso acentuado, e a ONU deve registrar esse progresso ou a sua ausência em termos claros. A integração plena dessas preocupações em áreas mais amplas de trabalho das Nações Unidas, tais como metas de desenvolvimento e Estado de direito, também é importante.

O Plano de Ação da ONU para a Segurança dos Jornalistas e a Questão da Impunidade, abriu uma nova janela de oportunidade para promover a justiça através do reforço da coordenação entre Estado, sociedade civil, mídia e atores da ONU. Houve alguns começos promissores, mas estes correm o risco de ficar à deriva, se maiores esforços, financeiros e políticos, não forem feitos para apoiá-los e uma ampla gama de agências da ONU não fizer mais para colaborar com contribuições concretas para o plano. Ao mesmo tempo, a mídia pode desempenhar um papel importante através de reportagens sobre este processo que se desenrola, e mantendo em destaque os casos de seus colegas mortos.

A luta pela justiça agora é global, mas seu avanço virá na forma de um caso de cada vez. Para cada suspeito rastreado, cada criminoso preso, e cada caso parado revigorado, a mensagem de que os jornalistas não podem ser atingidos sem consequência fica mais clara. Essa mensagem vai salvar vidas e melhorar o fluxo de informação essencial no coração de nossa sociedade global.

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