O jornalista António Aly Silva depois de ter sido raptado e atacado em Bissau, Guiné-Bissau, em 9 de março de 2021. (Foto: António Aly Silva)

António Aly Silva, editor da Guiné-Bissau, sequestrado e espancado

Lisboa, 16 de março de 2021 – As autoridades guineenses devem investigar exaustivamente o atentado ao jornalista António Aly Silva e garantir que os responsáveis ​​sejam responsabilizados, afirmou hoje o Comité para a Proteção dos Jornalistas (CPJ).

Por volta das 14:00 no dia 9 de Março, em Bissau, na capital, quatro homens à paisana sequestraram Silva à mão armada, levaram-no para fora da cidade, ameaçaram-no, roubaram-no e espancaram-no até o deixar inconsciente, segundo o jornalista, que falou ao CPJ por via de um aplicativo de mensagens, e de reportagens da imprensa. Silva disse ao CPJ que não conhecia a identidade ou os motivos dos agressores.

Silva edita o site de notícias privado Ditadura de Consenso, que frequentemente critica o governo do país e o presidente Umaro Sissoco Embaló.

Silva revelou que Embaló telefonou recentemente para ele para reclamar de um artigo crítico à decisão do governo da Guiné-Bissau de pagar um avião fretado pelo presidente de Cabo Verde.

“Ele ameaçou colocar-me no meu lugar e depois isto acontece”, disse Silva.

“As autoridades da Guiné-Bissau devem investigar exaustivamente o terrível ataque contra o jornalista António Aly Silva, determinar o motivo e processar todos os responsáveis”, disse em Nova York a coordenadora do programa do CPJ para a África, Angela Quintal. “O Presidente Embaló deve enviar uma mensagem clara de que os ataques à imprensa não serão tolerados e comprometer-se publicamente com a liberdade de imprensa na Guiné-Bissau, garantindo a segurança de Silva e de todos os jornalistas do país.”

Os quatro homens pararam o veículo de Silva à mão armada numa rua movimentada de Bissau, forçaram-no a sair e empurraram-no para dentro de uma carrinha branca sem identificação; e levaram-no ao Alto de Bandin, uma área industrial a cerca de 10 minutos do centro da cidade, disse ele ao CPJ.

Lá, os homens ameaçaram-no com uma espingarda AK-47 e o forçaram a desbloquear o telefone e fornecer sua senha, explicou Silva. Eles também cobriram seus olhos com a sua camisa, tentaram estrangulá-lo, socaram-no e espancaram com as espingardas até que perdeu a consciência, disse o jornalista.

“Eles gritavam que estavam ali para me matar”, contou Silva, acrescentando que seus agressores não se referiram às suas reportagens nem disseram qualquer outra coisa, e que também roubaram sua carteira e telefone.

Silva recuperou a consciência depois de transeuntes chegarem e o ajudarem. Eles levaram-no até uma estrada próxima onde pediu boleia até uma enfermaria administrada pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas, onde foi tratado e recebeu analgésicos. O ataque  deixou-o com hematomas e cortes no corpo e na cabeça, além de um corte na língua, que lhe dificulta falar e comer, disse Silva.

Ele descreveu a experiência como “um dia de puro terror”. E disse que os homens usavam roupas civis, embora tenha notado que três deles usavam o que pareciam ser t-shirts militares verde-oliva por baixo das roupas.

Silva disse ao CPJ e à agência de notícias portuguesa Lusa que não tinha ido a um hospital público nem registrado o caso na polícia porque não confiava em instituições públicas.

A Liga Guineense de Direitos Humanos (LGDH) uma organização sem fins lucrativos, entrou com uma queixa junto à Polícia Judiciária em seu nome, de acordo com Silva e o vice-presidente da LGDH, Bubacar Turé, que conversou com o CPJ por telefone. Após o ataque, a LGDH juntou-se a outros 22 grupos numa declaração em apoio a Silva, e apelando a Embaló para garantir que a paz, a segurança e a proteção sejam mantidas no país.

Contatado pelo CPJ por meio de um aplicativo de mensagens, um porta-voz do Ministério Público, Queba Coma, encaminhou um comunicado condenando o atentado e informando que a Procuradoria havia aberto um inquérito formal para identificar e processar os agressores.

A porta-voz da presidência, Pamela Ferreira, disse ao CPJ por meio de um aplicativo de mensagens que o presidente “não era uma pessoa violenta”, e citou reportagens na mídia nas quais Embaló negou qualquer envolvimento no ataque.

“O presidente instruiu pessoalmente as autoridades competentes, o Ministério Público e o Ministro do Interior a investigarem exaustivamente os ataques”, disse ela ao CPJ. Ferreira disse não saber se o presidente ligou para Silva e não poderia comentar.

Em 2012, o CPJ documentou como soldados prenderam Silva e o ameaçaram de morte, levando-o a fugir do país. Silva disse ao CPJ que foi repetidamente preso, espancado e assediado por causa de seu trabalho desde 1992.