São Paulo, 15 de fevereiro de 2017 – Um juiz ordenou que dois dos maiores jornais nacionais do país, Folha de S.Paulo e O Globo, retirem de seus sites histórias sobre o caso judicial de um hacker condenado por tentativa de chantagem contra a primeira-dama brasileira, Marcela Temer, segundo relatos de ambos os jornais.
Ambos os jornais obedeceram à ordem de um juiz de Brasília, concedida em 13 de fevereiro, depois que os advogados da esposa do presidente Michel Temer, Marcela, apresentaram um pedido de liminar em 10 de fevereiro, alegando que as matérias jornalísticas violavam sua privacidade, segundo reportado pela imprensa.
“A decisão judicial que forçou os jornais brasileiros Folha de S.Paulo e O Globo a remover conteúdo é um ato de censura e deve ser revertida quando examinado o apelo à justiça”, disse Carlos Lauría, coordenador sênior do Programa das Américas do CPJ, em Nova York. “Os brasileiros têm o direito de ser informados sobre questões de claro interesse público”.
A medida baseou-se em reportagens sobre um caso judicial de um brasileiro considerado culpado, em outubro, de tentar extorquir Marcela Temer depois de hackear seu telefone celular em abril de 2016, segundo reportagens da imprensa. Os documentos judiciais foram colocados em sigilo, conhecido como “Segredo de Justiça”, usado frequentemente em casos sensíveis no Brasil, segundo reportagens da imprensa. Depois que esse tipo de ordem é levantada, a informação torna-se pública.
Quando a ordem de segredo de justiça no processo judicial foi levantada, a Folha de S.Paulo e O Globo publicaram detalhes sobre ele, incluindo mensagens do WhatsApp entre o chantagista e Marcela Temer, de acordo com o The Intercept.
A Folha de S.Paulo recebeu uma ordem judicial sobre sua cobertura em 10 de fevereiro, na mesma data em que publicou uma reportagem sobre o caso. O Globo informou em 13 de fevereiro que havia retirado um artigo sobre o processo depois de receber uma ordem judicial.
A ordem judicial exige que os jornais se abstenham de publicar qualquer material futuro sobre o caso, incluindo detalhes das mensagens de chantagem enviadas a Marcela Temer, segundo relatos da imprensa. Os jornais disseram que, se continuassem a publicar, poderiam sofrer uma multa de R$ 50 mil (cerca de US$ 16.300), informou a Folha de S.Paulo em um artigo sobre o caso.
De acordo com a Associated Press, o diretor jurídico da Folha de S.Paulo, Orlando Molina, disse que apelará contra o que descreveu como um ataque à liberdade de expressão. O Globo também vai recorrer da decisão, de acordo com reportagens.
Quando o chantagista se aproximou de sua esposa, Temer era presidente em exercício e se preparava para assumir a presidência, de acordo com a Associated Press. Na época, o parlamento brasileiro estava debatendo o impeachment de sua companheira de chapa, a então presidente Dilma Rousseff.
Temer nega que a liminar constitua censura, disse seu porta-voz. O porta-voz declarou aos repórteres que o presidente tem um compromisso “permanente e inabalável” com uma imprensa livre, de acordo com O Globo.
Vários grupos de imprensa do Brasil, como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, a Associação Nacional de Editores de Revistas, a Associação Brasileira de Rádio e Televisão, a Associação Nacional de Jornais e a Associação Brasileira de Imprensa, denunciaram a decisão como uma censura perigosa e injustificada.
The Intercept relatou sobre a injunção e publicou extratos das audiências do tribunal, dizendo que o público merecia saber detalhes do caso. A entidade prometeu lutar para que todas as decisões judiciais de censura sejam derrubadas.
“Consideramos que as ordens judiciais que obrigam os jornais a suprimir reportagens, obtidas por uma autoridade política, constituem uma grande ameaça à liberdade de imprensa e combateremos tais medidas de todas as formas possíveis”, disse Glenn Greenwald, do The Intercept, ao CPJ.
ATUALIZAÇÃO: Um tribunal de apelação anulou a liminar contra a Folha de S.Paulo no final do dia 15 de fevereiro de 2017, de acordo com O Globo.