São Paulo, 22 de novembro de 2023 – O Comitê para Proteção de Jornalistas (CPJ) pediu aos tribunais do Brasil que anulem a sentença de um ano de cárcere dada à jornalista Schirlei Alves por sua reportagem sobre os maus-tratos a uma mulher durante audiência de um processo de estupro que teve grande repercussão.
Em 15 de novembro, Alves, uma jornalista freelancer, foi condenada a um ano de prisão e a pagar uma multa de R$ 400.000,00 (US$ 81.692,00) por supostamente difamar o juiz Rudson Marcos e o promotor Thiago Carriço de Oliveira, envolvidos em um julgamento de estupro em 2020 movido pela influenciadora digital Mariana Ferrer, de acordo com várias fontes de notícias.
Ferrer alegou ter sido drogada e estuprada em uma festa em 2018 por um empresário. No julgamento, o advogado do réu tentou culpar Ferrer apresentando fotos sensuais dela como modelo, as quais ele descreveu como “ginecológicas”, acusou-a de “choro falso” e agradeceu a Deus por ela não ser sua filha, relatou Alves ao The Intercept Brasil e ao ND+.
O réu foi absolvido.
Em uma decisão preliminar em dezembro de 2020, um tribunal ordenou que o The Intercept Brasil e o ND+ “retificassem” suas reportagens depois que Oliveira alegou que Alves o havia difamado. A decisão do juiz instruiu os veículos a adicionar linguagem específica às suas reportagens, o que foi feito, destacando que o juiz Marcos fez intervenções para manter a ordem e que Oliveira, como promotor principal no caso, advertiu o advogado de defesa sobre sua linha de questionamento.
O caso repercutiu nacionalmente e levou à aprovação, em 2021, da Lei Mariana Ferrer, que pune agentes públicos que violam a dignidade de vítimas ou testemunhas de violência sexual no tribunal.
“Apelamos ao sistema de justiça do Brasil para reparar essa injustiça flagrante contra a jornalista Schirlei Alves, cuja reportagem sobre a humilhação de uma jovem no banco das testemunhas levou a uma reforma legal para proteger as vítimas de estupro”, disse Cristina Zahar, coordenadora do programa do CPJ para a América Latina e o Caribe. “Em vez de tratar uma jornalista como criminosa por cumprir seu dever de informar o público, o Brasil deveria seguir os padrões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, que prevê que casos de injúria, calúnia e difamação sejam tratados em tribunais civis.”
O advogado da jornalista, Rafael Fagundes, disse ao CPJ que a decisão foi “arbitrária e ilegal”.
“Essa decisão pode ser uma ameaça àqueles que ousam reportar quaisquer abusos cometidos pelo judiciário”, acrescentando que havia apelado da decisão.
A juíza Andrea Cristina Rodrigues Studer, titular da 5ª Vara Criminal de Florianópolis, que proferiu a sentença de 15 de novembro, disse ao CPJ que os juízes não comentam suas decisões.