Da esquerda para a direita, Justino Campos, Daniel Lutaka, Anselmo Nhati, Orlando Luis, António Luamba, e Telmo Gama; os seis repórteres foram agredidos enquanto cobriam uma greve nacional em Angola a 10 de janeiro de 2022. (Campos; Nhati; Gama)

Jornalistas angolanos dos meios de comunicação social públicos agredidos, apontados como “vendidos” enquanto cobriam greve geral nacional

Nova Iorque, 18 de janeiro de 2022 – As autoridades angolanas devem garantir a segurança dos jornalistas que cobrem os protestos e investigar os recentes incidentes de agressão, disse hoje o Comité para Proteção de Jornalistas (CPJ).

No dia 10 de Janeiro, seis repórteres que trabalhavam para as cadeias de noticias da TV Zimbo e TV Palanca foram agredidos por pessoas não identificadas e forçados a fugir para um local seguro enquanto reportavam sobre uma greve nacional por parte de taxistas na capital Luanda, de acordo com reportagens dos media e dos jornalistas, que falaram com o CPJ por telefone.

A greve nacional foi um protesto contra as restrições à COVID-19, o mau estado das estradas, exigências de benefícios de segurança social, e um apelo ao fim da alegada extorsão pela polícia, de acordo com relatos dos meios de comunicação social.

O repórter da TV Zimbo Telmo Gama e o seu operador de câmara Justino Campos, e os repórteres da TV Palanca Anselmo Nhati e Orlando Luís e os operadores de câmara António Luamba e Daniel Lutaka, estavam a cobrir o protesto quando algumas pessoas entre os manifestantes se viraram contra os jornalistas e chamaram a equipa da TV Zimbo de ” vendidos”, disseram os jornalistas ao CPJ. O protesto tornou-se rapidamente violento, e eles foram forçados a sair. 

O secretário-geral do Sindicato dos Jornalistas, Teixeira Cândido, disse ao CPJ, através de um telefonema, que os jornalistas dos media públicos estão a tornar-se cada vez mais alvos da ira das pessoas devido à perceção de parcialidade a favor do governo e do partido no poder. A TV Zimbo e a TV Palanca foram nacionalizadas pelo governo angolano em meados de 2020, como documentado pelo CPJ.

“Como demonstrado pelo recente ataque às equipas noticiosas da TV Zimbo e da TV Palanca, os repórteres parecem ser os bodes expiatórios para a percepção da raiva de alguns cidadãos em relação ao Estado”, disse a coordenadora do programa do CPJ para a África, Angela Quintal. “O CPJ está cada vez mais preocupado com a deterioração do ambiente para a liberdade de imprensa em Angola, à medida que o país se aproxima das eleições no final deste ano. A imprensa deveria poder realizar o seu trabalho livre de intimidação e risco de agressão, para que todos os angolanos possam usufruir do seu direito à diversidade e pluralidade de notícias e informações”.

Por volta das 7 da manhã do dia 10 de Janeiro, Campos foi o primeiro a chegar à praça principal de táxis no subúrbio de Benfica, em Luanda, quando os motoristas davam início aos preparativos para bloquear as estradas, disse ele ao CPJ. Inicialmente, os manifestantes acolheram a atenção dos órgãos de comunicação social, dizendo que deveriam relatar o que estava a acontecer, no entanto, as atitudes mudaram quando ele começou a filmar o vandalismo e o ataque incendiário a um edifício propriedade do partido governamental Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA).

“Alguém começou a gritar que éramos uns vendidos”, disse Campos, acrescentando que ele e Gama saíram dali para tentar encontrar um local seguro para fazer a sua reportagem. Gama disse ao CPJ que estava a segurar um microfone com o logotipo da TV Zimbo, enquanto Campos segurava a câmara quando foram novamente confrontados por manifestantes e vendedores ambulantes que se juntaram a eles para empurrar os jornalistas e gritar insultos.

Os manifestantes incendiaram documentos e equipamento do escritório destruído; Campos foi esmurrado pelo menos quatro vezes no seu ombro esquerdo e uma t-shirt do MPLA em chamas foi-lhe atirada, segundo Campos.

“Não fui gravemente ferido fisicamente, mas temi pelas nossas vidas quando me apercebi que nos tinham atirado gasolina às costas, enquanto estávamos a correr em direção ao posto policial próximo”, disse Gama.

Cerca de cinco manifestantes tentaram protegê-los, escoltando Campos e Gama à esquadra da polícia a poucos metros de distância, enquanto diziam aos que os perseguiam que os jornalistas estavam apenas a fazer o seu trabalho, informaram os jornalistas ao CPJ. Campos e Gama disseram que não havia polícia no local do protesto.

Por volta das 9 da manhã, Luis e a sua equipa da TV Palanca chegaram ao local e posicionaram-se para filmar o escritório em chamas e o vandalismo, disse ao CPJ. Algumas pessoas em meio à multidão de manifestantes começaram a atirar pedras a um autocarro do Ministério da Saúde antes de o incendiar, obrigando os passageiros a fugir para salvar as suas vidas, descreveu ele.

Luis e a sua equipa foram esmurrados por pessoas que tentaram levar o seu equipamento, afirmou Luis, acrescentando que alguém o encharcou com gasolina e, quando se virou, viu que alguém acendia um fósforo. “Tive sorte que o fósforo caiu no chão quando uma pessoa foi contra ele antes que pudesse atirá-lo contra mim”, disse Luis à CPJ.

Nhati relatou ao CPJ que foi agarrado pelas costas, teve um braço apertado à volta do pescoço durante cerca de 30 segundos, e foi pontapeado nas pernas por um homem não identificado que tentou levá-lo ao chão. Nhati tentou fugir, mas ficou enredado no longo cabo do seu microfone. Luis agarrou o microfone enquanto Nhati tentava libertar-se, e quando um dos agressores tropeçou e caiu, Nhati foi capaz de escapar, disse ao CPJ.

Luis disse ter sido salvo por um polícia de trânsito que colocou os seus braços à volta da cabeça do repórter, como se viu nas imagens de vídeo revistas pelo CPJ. O polícia acompanhou-o a ele e a Nhati ao posto da polícia enquanto garrafas e outros detritos eram atirados contra eles. 

Luamba e Lutaka disseram ao CPJ que viram os seus colegas serem alvo de garrafas e gasolina e, por isso, correram para uma estação de serviço próxima com guardas de segurança privados, na direção oposta, acrescentando que sairam ilesos.

Ambos se juntaram a Nhati e Luis no posto de polícia, onde permaneceram por cerca de duas horas antes de regressarem às redações para trabalharem nas suas reportagens, de acordo com Nhati.

Luis disse ter coberto a greve dos taxistas na semana anterior, tendo entrevistado os organizadores, e que não acredita que os taxistas foram os culpados pela violência, mas sim “pessoas politicamente motivadas” que estavam a aproveitar-se do protesto. Manuel Faustino, presidente da Associação de Táxis de Luanda, concordou numa chamada telefónica com o CPJ, acrescentando que a greve tinha a ver com “direitos dos trabalhadores”, e que a associação “condenou veementemente” a violência.

A Polícia Nacional afirmou que “o instigador moral” do vandalismo e da agressão de um jornalista da TV Palanca está detido, de acordo com uma reportagem. Nenhum dos jornalistas apresentou queixa junto da polícia, que prendeu pelo menos 29 manifestantes acusados de vandalismo e danos materiais, de acordo com as informações da imprensa.

Contatado por telefone, Nestor Goubel, porta-voz da polícia nacional em Luanda, recusou-se a comentar o pedido de informação do CPJ sobre os manifestantes que atacaram os jornalistas. Em vez disso, remeteu o CPJ para as suas entrevistas anteriores sobre o assunto antes de desligar.