Ataques à Imprensa em 2010: Honduras

Principais Acontecimentos
• Onda de assassinatos de jornalistas ocorre em uma atmosfera politizada e de ilegalidade.
• Em investigações de assassinatos, as autoridades são negligentes e indiferentes.


Estatística em Destaque
3: meses se passaram entre o assassinato de Nahúm Palacios Arteaga e o momento em que as autoridades realizaram a autópsia.

Seis jornalistas foram assassinados no breve espaço de sete semanas, e outros três no final do ano, em uma onda de homicídios que se tornou ainda mais chocante devido à resposta descuidada e indiferente do governo. O trabalho de investigação negligente e inapto rendeu a prisão de apenas dois suspeitos em todos os assassinatos, e um juiz rapidamente rejeitou as acusações contra eles. O CPJ apurou que pelo menos três das vítimas foram assassinadas em represália direta por seu trabalho, e continuou investigando os outros casos até o final do ano.

ATAQUES À
IMPRENSA EM 2010

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Ataques e fatao
em toda a região

Em meio à onda de crimes, o Ministro de Segurança, Oscar Álvarez, descartou completamente a relação com motivos profissionais. “Eu garanto que em todos [os casos] não há nada que indique que é por causa de seu trabalho jornalístico”, declarou ele, segundo o jornal La Tribuna de Tegucigalpa. Mike O’Connor, consultor do CPJ, viajou a Honduras logo após o ocorrido para investigar os assassinatos e elaborar um relatório especial, publicado em julho, que revelou um clima alarmante de impunidade no qual as autoridades não estavam aptas ou não demonstravam vontade de investigar os crimes e prender os responsáveis. Em um dos casos, o governo ignorou uma diretriz da Organização dos Estados Americanos para garantir proteção a um jornalista ameaçado — um proeminente âncora de televisão que logo depois foi morto a tiros. Embora a investigação do CPJ não tenha apurado uma conspiração política ou esforços coordenados por trás dos assassinatos, ela descobriu que os assassinatos ocorreram em uma atmosfera politizada e carregada de violência e ilegalidade.

A violência refletiu a ruptura social posterior ao golpe militar de junho de 2009 que derrubou presidente esquerdista Manuel Zelaya, apurou o CPJ. Após cinco meses de governo interino, as eleições presidências de novembro de 2009 levaram o conservador Porfirio “Pepe” Lobo ao poder. Mas Lobo encontrou uma significativa oposição doméstica quando assumiu em janeiro de 2010, com críticos denunciando sua eleição como o produto contaminado de um golpe ilegal. Simpatizantes de Zelaya, jornalistas e outros críticos denunciaram que o clima de repressão continuava em 2010, incluindo ataques violentos. Numerosos jornalistas contaram ao CPJ que sentiam que poderiam tornar-se alvo se fossem vistos como oponentes do governo ou de poderosos empresários. Grupos de direitos humanos que defendem camponeses em disputas de terra disseram que seus líderes foram seqüestrados ou assassinados por agentes do governo ou por grupos particulares.

Uma avaliação do Departamento de Estado dos Estados Unidos sobre os direitos humanos em Honduras, publicado em março de 2010, se referia em termos duros e não usuais ao país com o qual os Estados Unidos sempre mantiveram relações amigáveis. Referindo-se aos crimes por motivação política, afirmava que “após o golpe de junho, houve relatos de que o governo de fato ou seus agentes cometeram assassinatos arbitrários ou ilegais”. O relatório também descreve um triste cenário para aqueles que querem se pronunciar publicamente contra o regime: “Um pequeno número de empresários, poderosos magnatas que compartilham vínculos comerciais, políticos e laços familiares é dono da maioria dos meios de comunicação do país”.

As investigações do governo sobre o assassinato de Nahúm Palacios Arteaga refletem o colapso do Estado de Direito, verificou o CPJ. Palacios, um âncora de televisão de Tocoa de 34 anos, que se opôs ao golpe de 2009, enfrentou uma perseguição tão severa por parte dos militares que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o braço de direitos humanos da Organização dos Estados Americanos, ordenou que o governo de Honduras protegesse a vida do jornalista. Essa foi uma das mais de 400 ordens deste tipo emitidas para jornalistas e ativistas em Honduras em 2009 e 2010. Embora obrigado por meio de tratado internacional a seguir as diretrizes, o governo hondurenho pareceu ignorar a maioria das ordens de proteção, incluindo a que implicava Palacios. Com suas reportagens sobre traficantes de drogas e assumindo a causa dos camponeses em disputas de terras, Palacios fez muitos outros inimigos, mostrou a pesquisa da CPJ.

Na noite de 14 de março, pistoleiros de tocaia na porta da residência de Palacios descarregaram uma rajada de tiros que provocou a morte do jornalista e de um companheiro. O sistema de aplicação da lei, que deveria ter garantido proteção para Palacios, também falhou ao não investigar adequadamente seu assassinato. Não realizaram nenhuma autópsia imediatamente após o homicídio, não foram tiradas fotos da cena do crime, nem foram coletadas evidências forenses da cena, reconheceram as autoridades em entrevistas com o CPJ. Três meses após o sepultamento de Palacios, investigadores exumaram o corpo e realizaram uma autópsia no cemitério. O promotor Arody Reyes explicou ao CPJ que a autópsia tornou-se subitamente importante porque o governo de Honduras conseguiu a ajuda do FBI. Investigadores hondurenhos, segundo Reyes, precisavam mostrar aos colegas norte-americanos alguma evidência.

A investigação do CPJ também encontrou motivos relacionados ao trabalho jornalístico nos homicídios de David Meza Montesinos e Joseph Hernández Ochoa.

Repórter da Radio América e de canais de televisão locais, Meza foi morto a tiros na porta de sua casa em La Ceiba no dia 11 de março. Assim como Palacios, Meza tinha se especializado em ajudar pessoas que acreditavam ter sido maltratadas pelo governo ou por empresas, disseram seus colegas ao CPJ. Pouco antes de ter sido assassinado, o jornalista havia começado a criticar severamente a polícia local por suposta corrupção e incompetência.

Hernández, de 25 anos, apresentador de um programa de entretenimento e notícias do Canal 5, foi morto a tiros em 1º de março, quando viajava de carro a Tegucigalpa com Karol Cabrera, uma das jornalistas mais controversas do país. Cabrera, que ficou gravemente ferida, disse acreditar que os agressores a tinham como alvo devido aos seus comentários na rádio, favoráveis ao governo. Ela também contou ao CPJ que havia recebido muitas ameaças de morte de grupos de esquerda; em junho, ela e seus filhos se mudaram para o Canadá.

Durante sua pesquisa, o CPJ falou com várias fontes que disseram que ambos, Meza e Palácios, haviam pedido dinheiro a figuras públicas em troca de coberturas favoráveis. Essas mesmas fontes, entretanto, disseram que a prática provavelmente não tinha nada a ver com os homicídios. Alegações de extorsão envolvendo jornalistas não são incomuns, verificou o CPJ.

Após o relatório do CPJ ter recebido ampla cobertura nos meios de comunicação, o governo hondurenho fez objeção às conclusões. Em uma carta de agosto ao The New York Times, a Ministra de Direitos Humanos, Ana Pineda, descartou a possibilidade de existirem motivos relacionados ao trabalho jornalístico nos homicídios, todos os quais foram “completamente investigados”. Carlos Lauría, Coordenador Sênior do Programa das Américas, respondeu no blog do CPJ: “Nossa preocupação com todos os homicídios de jornalistas se baseia no fato de as autoridades hondurenhas desejarem minimizar o clima de impunidade nos casos de violência contra a imprensa e desconsiderarem os motivos políticos por trás de tais ações. Afirmando em sua carta para o Times que os homicídios eram produto do ‘crime organizado e do crime comum’, Pineda parece mostrar que o governo ainda não está pronto para confrontar os fatos”.