Rio de Janeiro, 15 de junho de 2021 – O Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ) acolhe hoje com satisfação uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) determinando que o estado de São Paulo indenize o fotojornalista Alex Silveira por um ferimento infligido por policiais.
Em 18 de maio de 2000, policiais militares atiraram em Silveira, então fotojornalista do jornal diário paulista Agora, no olho com uma bala de borracha enquanto ele cobria um protesto de professores da rede pública, de acordo com informações da imprensa e com o fotojornalista, que falou com o CPJ em uma entrevista por telefone.
Nos meses seguintes, Silveira foi submetido a seis cirurgias oculares e perdeu quase toda a visão em seu olho esquerdo e, em 2003, entrou com uma ação civil pedindo indenização ao estado de São Paulo, relatou.
Em 10 de junho, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o estado de São Paulo era responsável pela lesão de Silveira, e ordenou que o estado o indenizasse, de acordo com as informações veiculadas e com o fotojornalista.
Silveira disse ao CPJ que a decisão foi um passo importante, mas acrescentou, “a batalha não acabou”. O tribunal não publicou sua decisão final, incluindo o valor da compensação financeira que o estado deveria pagar, e o precedente específico estabelecido para futuras decisões em casos similares, afirmou Silveira. Em um e-mail para o CPJ, a assessoria de imprensa do STF informou que o acórdão seria publicado em até 60 dias após o julgamento.
“A decisão do Supremo Tribunal Federal brasileiro que responsabiliza o estado de São Paulo por policiais atirarem no olho do fotojornalista Alex Silveira é um passo importante para a justiça, mas o tribunal deve garantir que ele receba uma compensação justa e estabelecer um precedente para proteger os jornalistas da violência policial”, disse Natalie Southwick, coordenadora do programa do CPJ para a América Central e do Sul, em Nova York. “Esta decisão não pode trazer de volta os 20 anos de vida que Silveira passou lutando por justiça ou restaurar sua visão, mas pode enviar uma mensagem clara de que as autoridades têm a obrigação de proteger os jornalistas que cobrem os protestos, não os usar para a prática de tiro ao alvo”.
Em 2008, a 5ª Vara de Fazenda Pública em São Paulo determinou que o estado deveria compensar Silveira; em 2014, entretanto, a 2ª Câmara Extraordinária de Direito Público do TJ-SP anulou essa decisão, decidindo que o jornalista tinha se colocado em risco e, portanto, era responsável por seus próprios danos, segundo informações da imprensa e Silveira; ele, então, recorreu ao Supremo Tribunal Federal.
“Só quando sair o acórdão é que vamos saber o impacto da decisão. Vai depender das excludentes que vão estabelecer para a responsabilidade do estado nesse tipo de caso e do valor que eles [STF] vão definir para danos morais e danos materiais”, afirmou Silveira ao CPJ. “Se a indenização não for significativa e justa, não vai ter efeito na prática. A decisão só vai ser efetiva se doer no estado de forma que comandantes da PM restrinjam o uso dessas armas menos letais”.
Tais Gasparian, advogada que trabalha na equipe jurídica de Silveira junto com sua colega Virgínia Garcia há mais de 18 anos, disse ao CPJ por um aplicativo de mensagens que a decisão mostrou que “o profissional de imprensa, no exercício de sua atividade, atua no interesse público, de tal sorte que, quando ferido por agentes do estado, deve ser indenizado”.
Separadamente, o fotojornalista freelancer Sérgio Silva também tem um processo civil pendente no Supremo Tribunal Federal pedindo indenização ao estado de São Paulo após policiais militares atirarem em seu olho enquanto ele fazia a cobertura de um protesto em 2013, de acordo com o noticiário e com o fotojornalista, que falou com o CPJ em entrevista por telefone.
“A preocupação agora é em relação aos detalhes que vão compor o acórdão [no caso de Silveira] que o STF ainda vai publicar. Pode ser algo positivo ou pode ser desastroso”, declarou Silva ao CPJ.
Pelo menos 25 jornalistas foram atacados ou detidos durante os protestos de âmbito nacional que Silva cobriu, como o CPJ documentou na ocasião.
Uma funcionária da assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que assinou o e-mail como Helena, respondeu ao CPJ que “o TJSP não emite nota sobre questão jurisdicional e informa que cumpre as decisões dos Tribunais Superiores”.
A assessora de imprensa Gabriela Amaral enviou ao CPJ um comunicado da Polícia Militar de São Paulo dizendo que o uso de balas de borracha e outras armas similares “é regulado por norma interna e se dá em condições específicas, por agentes habilitados e treinados para seu uso”.
Silveira disse ao CPJ que “nada me fez sofrer tanto como a busca por justiça por 20 anos. É muito cansativo, e não é algo que se pode fazer sozinho. Contei com o apoio de muitas instituições e de um escritório de advocacia, sem eles não seria possível. Acho que o estado usa isso [um processo longo], querem cansar a gente até a gente desistir de buscar nossos direitos”.