Nova Iorque, 30 de abril de 2021 – As autoridades angolanas devem retirar as acusações de difamação criminal e insulto contra o editor Francisco Rasgado e reformar as leis do país para descriminalizar o jornalismo, disse hoje o Comité para a Proteção dos Jornalistas (CPJ).
No dia 23 de abril, policiais prenderam Rasgado, fundador e diretor do jornal privado Chela Press, em sua casa na cidade de Benguela por suposta falta de comparência no tribunal por acusação de difamação criminal e injúria contra Rui Falcão, secretário de informação do partido no governo Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), segundo reportagens dos media, o jornalista e o seu advogado, José Faria, que falaram ao CPJ em entrevistas por telefone.
Os policiais alegaram que Rasgado não compareceu a uma audiência a 22 de abril, mas Faria disse ao CPJ que seu cliente nunca foi notificado de tal audiência. Rasgado contou que passou o fim de semana na prisão e foi libertado no dia 26 de abril, e compareceu a uma audiência no dia seguinte. Seu próximo julgamento está marcado para 3 de maio, disse Faria.
Faria contou ao CPJ que Falcão exige uma indemnização de 1 bilião de kwanzas (US $ 1,5 milhão). Se for condenado, Rasgado também pode enfrentar multas, até seis meses de prisão por difamação criminal e até dois meses pela acusação de insulto, segundo o código penal de Angola.
“As figuras públicas angolanas precisam desenvolver a couraça e não devem recorrer às leis de difamação e insulto da era colonial porque se sentem ofendidas com relatos da mídia expondo alegada corrupção e má administração”, disse em Nova York a coordenadora do programa para a África do CPJ, Angela Quintal. “Em vez de perseguir o jornalista Francisco Rasgado, o oficial do MPLA Rui Falcão deveria usar sua influência como alto funcionário do partido para pressionar pela revogação das leis de difamação e insultos criminais de Angola, de acordo com a tendência em outras partes da África e do mundo”.
A denúncia de Falcão, ex-governador da província de Benguela, no sul de Angola, diz respeito a artigos publicados pela Chela Press, e republicados pela sua conta no Facebook, em julho e agosto de 2020, acusando a sua administração de corrupção, incluindo em um negócio de construção local, segundo Rasgado e informações da imprensa.
Depois de ver as investigações publicadas, a mídia local noticiou que Falcão prometeu mover uma ação judicial contra Rasgado e declarou que ele deveria receber uma “surra no estilo caraté”.
O CPJ telefonou e enviou mensagem de texto a Falcão para comentários, mas ele não respondeu.
Faria e Rasgado disseram ao CPJ que ainda que o jornalista tivesse ignorado deliberadamente a data do julgamento, ele deveria ter tido cinco dias para justificar sua ausência antes de ser preso, de acordo com o código de processo penal de Angola e, portanto, seu mandado de prisão foi emitido ilegalmente.
O mandado de prisão, assinado pelo Juiz António Santana e revisto pelo CPJ, limita-se a declarar que o motivo da detenção do jornalista era “aguardar os termos do processo que lhe moveu o juiz”. Quando o CPJ ligou para solicitar os comentários de Santana, o juiz desligou depois de o CPJ perguntar sobre a legalidade da detenção de Rasgado e não respondeu às ligações e mensagens de texto subsequentes.
Rasgado relatou ao CPJ que foi preso na frente das seus duas crianças e que quatro policiais fortemente armados ameaçaram alvejá-lo por questionar a ausência de detalhes no mandado de prisão.
Teixeira Cândido, presidente do Sindicato dos Jornalistas Angolanos, expressou preocupação com a acusação contra Rasgado em entrevista telefónica ao CPJ, afirmando que o juiz parecia ter predeterminado a culpa de Rasgado, embora houvesse provas de que o que o jornalista publicara era verdade e estava apoiado por evidências documentais.
“Os advogados de defesa levantaram uma série de irregularidades que parecem ter sido ignoradas e, como o juiz deteve Rasgado ilegalmente, não há motivos para otimismo e devemos estar preparados para que esse juiz condene Rasgado”, disse Cândido ao CPJ.
A Friends of Angola, uma organização sem fins lucrativos de direitos humanos com sede em Washington, D.C., enviou uma carta aberta a Falcão e ao presidente João Lourenço condenando a detenção e acusação de Rasgado.
A polícia em Angola recentemente interrogou o jornalista Mariano Brás por alegadamente insultar o Presidente Lourenço, e deteve o repórter Jorge Manuel por cinco dias por realizar o seu trabalho, como o CPJ documentou na época.