Lei contra discriminação gera preocupação na Bolívia

18 de outubro de 2010

Excelentíssimo Senhor Evo Morales Ayma
Presidente do Estado Plurinacional da Bolívia
Palácio de Governo
La Paz, Bolívia

Via fax: (591-2) 2202321

Excelentíssimo Presidente Morales:

Escrevemos a V. Ex.ª para expressar nossa preocupação com algumas disposições incluídas na nova lei contra a discriminação que ameaçam limitar a liberdade de imprensa na Bolívia. Nós o instamos a impulsionar emendas na lei que resguardem as garantias constitucionais sobre liberdade de expressão.

No último dia 8 de outubro, o Senado boliviano aprovou a Lei contra o Racismo e Toda Forma de Discriminação que tem como objetivos a prevenção e punição de atos de racismo e discriminação. O texto da lei deixou numerosos jornalistas e meios de comunicação bolivianos preocupados pelas sanções que poderiam enfrentar pelo exercício do jornalismo.

De acordo com o artigo 16 da nova lei, “qualquer meio de comunicação que endossar ou publicar ideias racistas e discriminatórias estará suscetível a sanções econômicas e à suspensão de sua licença de funcionamento”. O artigo 23, por sua vez, estabelece que jornalistas ou proprietários de meios de comunicação que divulguem tais ideias poderão enfrentar sentenças de um a cinco anos de prisão, e não poderão alegar imunidade ou qualquer outro privilégio.

Organizações de liberdade de imprensa, tanto bolivianas quanto internacionais, incluindo 24 membros do Intercâmbio Internacional pela Liberdade de Imprensa (IFEX) encaminharam uma carta em 7 de outubro ao presidente da Assembleia Legislativa, Álvaro García Linera, expressando suas preocupações de que estas disposições da nova lei passam causar prejuízos à liberdade de informação na Bolívia.

O CPJ está particularmente preocupado pela linguagem ampla e imprecisa utilizada nestes artigos, que podem ser utilizados para restringir ou punir o jornalismo. Por exemplo, a nova lei pode ser invocada para solicitar punições civis, ou mesmo penais, contra meios de comunicação ou jornalistas que publiquem ou transmitam uma entrevista de grande valor informativo, na qual o entrevistado emita declarações que as autoridades possam considerar racistas ou discriminatórias. Também estamos preocupados que a difusão de opiniões de terceiros – por exemplo, um site de internet que permite ao público realizar comentários – possa provocar uma investigação do governo e possíveis sanções contra o meio de comunicação.

Além disso, a linguagem vaga dos artigos poderia promover a autocensura entre os jornalistas e, inclusive, permitiria ao governo suprimir discursos que considere racista ou discriminatório sem determinar claramente o significado destes termos. Ao enfrentar o risco de possíveis penas de prisão ou sanções econômicas, jornalistas bolivianos admitiram que optariam por não divulgar informações que, em outras circunstâncias, seriam fornecidas ao público.

A Constituição da Bolívia garante a liberdade de expressão, o que inclui o direito de realizar declarações que possam ser contrárias aos interesses de determinados grupos ou indivíduos. Se estas expressões não são toleradas, tal garantia constitucional perde a sua razão de existir.

Agradecemos a sua atenção a este importante tema e esperamos contar com sua resposta.

Cordialmente,

Joel Simon

Diretor-Executivo

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