Em uma vitória para a imprensa, supremo tribunal brasileiro derruba lei repressiva

Nova York, 7 de maio de 2009–A decisão do Supremo Tribunal Federal brasileiro de derrubar a Lei de Imprensa de 1967, que impunha duras penas por calúnia e difamação, é um passo crucial em direção à campanha pela eliminação da difamação como delito punível com prisão nas Américas, disse hoje o Comitê para a Proteção dos Jornalistas. O CPJ e outros grupos há muito tempo solicitavam que esta lei anacrônica fosse removida da legislação.

O tribunal máximo do Brasil decidiu por 7 votos a 4, em 30 de abril, que a lei de 1967 violava a garantia constitucional de liberdade de expressão, segundo informações da imprensa local e internacional.

Adotada durante a ditadura militar que vigorou no Brasil entre 1961 e 1985, a regulamentação previa sanções de até três anos de prisão para difamação. A Lei de Imprensa definia supostas violações em termos amplos que incluíam reportagens consideradas ofensivas à moral pública; que o demandante considerasse nociva a sua reputação ou ofensiva a sua dignidade; as consideradas nocivas à ordem pública e política; e reportagens sobre fatos “verdadeiros” que fossem consideradas distorcidas ou provocativas. Também permitia que as autoridades censurassem os meios de comunicação e jornalistas, e que confiscassem publicações.

“Nós elogiamos o Supremo Tribunal brasileiro por eliminar esta lei de imprensa claramente repressiva” disse o Coordenador Sênior do Programa das Américas, Carlos Lauría. “Isto é um marco na batalha para eliminar a difamação criminal na América Latina e em todo o mundo”.

Jornalistas brasileiros ainda podem ser encarcerados por até dois anos devido às leis por difamação que permanecem no Código Penal. “Urgimos as autoridades brasileiras a prosseguirem no mesmo espírito desta decisão e revogarem todas as leis que impõem penas de prisão por difamação”, acrescentou Lauría.

A Lei de Imprensa de 1967 tem sido usada sistematicamente para perseguir jornalistas críticos. Processos criminais por difamação contra a mídia brasileira foram contados às centenas nos últimos cinco anos, de acordo com as pesquisas do CPJ e informações da imprensa. Empresários, políticos e funcionários públicos têm impetrado múltiplas ações judiciais contra meios de comunicação e jornalistas como forma de pressioná-los, estressar seus recursos financeiros, e forçá-los a conter a crítica.

Um caso notório é o de Lúcio Flávio Pinto, editor do periódico quinzenal Jornal Pessoal e ganhador do Prêmio Internacional da Liberdade de Expressão do CPJ em 2005. Pinto, que vive na cidade de Belém, no estado do Pará, noticiava sobre tráfico de drogas, devastação ambiental, e corrupção política e empresarial. Em resposta, disse Pinto ao CPJ em uma entrevista em 2005, foi ameaçado, agredido fisicamente, e alvo de dúzias de processos penais e civis por difamação.

Como parte de uma campanha sistemática visando a eliminação das leis criminais por difamação na América Latina, o CPJ tem pressionado pelo fim da restritiva lei brasileira de 1967. Em novembro de 2005, o CPJ instou o governo federal brasileiro a entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal para anular a Lei de Imprensa, que foi usada por poderosos querelantes para silenciar jornalistas em todo o país.

Em fevereiro de 2008, o Supremo Tribunal Federal decidiu que 22 dos artigos da Lei de Imprensa eram incompatíveis com a Constituição de 1998, que garante a liberdade de expressão e proíbe a censura. O tribunal suspendeu os artigos até que fosse tomada, neste ano, a decisão final sobre a constitucionalidade da lei.

A nova decisão suplementa a crescente opinião legal internacional de que jornalistas não devem ser aprisionados por difamação. Em setembro de 2004, a Corte Interamericana, braço legal da Organização dos Estados Americanos, decidiu que a condenação penal por difamação do político paraguaio Ricardo Canese violava o direito internacional.  A corte declarou que os próprios procedimentos criminais violavam a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que o Paraguai havia ratificado, por que não eram “necessários em uma sociedade democrática”.

Em uma decisão de agosto de 2004, que anulou a sentença condenatória por difamação do jornalista costarriquenho Mauricio Herrera Ulloa, a Corte Interamericana disse que a crítica a funcionários públicos devem ter “espaço para que possa haver um amplo debate sobre assuntos de interesse público”.

E em abril de 2007, o presidente mexicano Felipe Calderón Hinoja assinou uma lei que efetivamente elimina as acusações criminais por calúnia e difamação em nível federal, direcionando as queixas para os tribunais civis. O México se juntou a El Salvador como os primeiros países na América Latina a revogar as leis sobre difamação de sua legislação criminal.